terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Ednaldo Pichetto


Sem pretensão de criticar, apenas vontade de conversar como um espectador inquieto e amigo. 

Hoje assisti SISTEMA 25, no SESC Santo Amaro. Nem deu tempo pra me lembrar de que foi dali que sai, do curso de teatro em 1984, de uma prova pública, tímida, com um texto “ ÉVORA” escrito pelo professor José Manoel.

Ele mesmo! O provocador do Sistema. 

Quando eu penso que Zé já fez tudo que podia ter feito, ele inventa uma nova surpresa, e que surpresa! Um espetáculo lindo, questionador, forte, provocador e que nos deixa envolvidos com cada caída. 

Cada queda é um momento para uma reflexão do sistema... Do meio... Da gente. Senti-me um deles. Me vi em vários deles e chorei muito ao ver minhas mazelas alí na minha frente, explicitadas pra todos, mas só eu sabendo que eram minhas. 

Ufa! Sistema 25 tira nossas máscaras, arrança o véu da auto ignorância, nos deixa nus para nós mesmos.

O elenco é maravilhoso, gente que eu não via há 20 anos, e aí, pra mim, foi uma sensação bônus, um reencontro. Atores maduros, digo experientes, junto com jovens talentos. E mesmo assim não dá pra destacar ninguém, pois cada um tem seu momento e aproveitam. E como aproveitam, viu? 


Homogeneidade e competência definem bem e pronto!

Estou com “INVEJA BRANCA”, pois vocês vão poder dizer “eu fiz parte do elenco do Sistema 25” e eu, assim como de “AVOAR”, não. (risos)


Arrependi-me de não ter assistido antes, pois não acreditei nas pessoas que assistiram e que me diziam que era tão bom que eu nem iria perceber que o espetáculo tinha 2 horas e 40 minutos de duração. Pena mesmo, já teria assistido mais vezes. 

E é verdade nem se percebe. 

Desculpe-me mas acho que é um espetáculo pra conversar logo após debate), pois algumas questões ficam vagando no meu juízo. Queria saber qual a visão do elenco e da produção para cenas como a da filha maculada ou La Pietá de sangue(batizei assim).

Pois foi a cena que mais me chocou, uma filha lamentando e chorando a morte do pai, seu algoz e estuprador. Lembrou-me uma La Pietá invertida, onde ao invés da mãe (Virgem imaculada),  ter piedade do filho, tínhamos a filha(virgem maculada)com piedade do pai. Uma La Pietá de Sangue, onde quem sangrava não era o corpo sem vida, e sim a virgem maculada. Cena que precisava ser conversada, pois há um clima de melancolia, de profundo pesar, mas sem o sofrimento pela mácula e no texto ela questiona se é justo condenar alguém por amar demais, como se defendendo o pai. "Ele me amava como mulher, mas eu o amava como filha. E qual filha não quer ver seu pai feliz?" (é mais ou menos assim o texto), quando sabemos que quem ama não macula jamais. A beleza trágica da cena, onde se somam momentos de angústia e momentos de serenidade, e especialmente na postura contida da filha. Torna–a mais chocante ainda, ver o pai possuindo a filha sob o olhar de uma Nossa senhora fantasma, inexistente, sem referencial humano algum, apenas luz e resplendor.


Obrigado por todas as sensações vividas hoje.